O que uma mulher leva para a cama?
Sexo ainda é um assunto tabu. Mas não esse sexozinho misógino da indústria pornô clichê. Esse atrapalha
bastante a vida sexual de homens e mulheres, principalmente adolescentes, com
suas mentiras plastificadas sobre corpo e sexualidade, mas não é tabu. É produto de livre circulação, consumido em larga escala. Quando muito, pode ser
tabu para algumas religiões.
Agora, se você quiser
testar no mundo uma coisa muito mais ofensiva do que sexo e muito mais herética
que o ateísmo, experimente abrir sua pequena boca para falar sobre liberdade
sexual feminina. Chuva de pedras, Madalena!
Pois é, o tabu é a sexualidade feminina. Mulher gostando, sabe? Por incrível que pareça. Ou não tão incrível, pra quem tem consciência da violência que sofre. E se nenhuma pessoa vai pra cama sozinha, imagine o que leva pra cama uma mulher!
Uma mulher média sofre
uma pesada repressão física e sexual desde bem pequena. Quando nasce, tem suas
orelhas furadas e carrega incômodos lacinhos na cabeça, usa vestidos desconfortáveis
que logo vão lhe impedir de agachar ou sentar com as pernas abertas porque “você já é uma mocinha, não pode ficar mostrando a
calcinha por aí”. Depois ela vai aprender que os meninos têm pinto ou pipi, dos
quais se orgulham muito e que são nomes tranquilos de dizer, enquanto ela... “Menina,
tira a mão daí!”. Xoxota, xaninha, periquita, pepeca... alguém conhece um único
nome pra buceta que não venha carregado de constrangimento?
Uma mulher média na
adolescência já aprendeu a não se masturbar, a ter vergonha dos seios, a nunca
ficar à vontade corporalmente, a temer os homens − que são seres superiores,
ainda que sejam menos capazes de se controlar sexualmente do que gorilas.
Aprendeu que seu único atributo de real valor é a beleza e, portanto, que é
feia demais, ou gorda demais, ou velha demais etc. Que homens e mulheres não
são iguais: homens são demais e mulheres são de menos.
Todos os dias, uma
mulher média sente medo de ser atacada pelo homem médio. A mulher média já
sentiu mais de uma vez um grande pavor com assédio de rua, ameaças de
parceiros, violência doméstica, no trabalho etc. Uma mulher média já foi
assediada e/ou molestada e/ou violentada. E aprendeu que a culpa é dela.
É isso que uma
mulher média leva pra cama. E é obviamente por isso que sexo consensual, leve,
relaxado, criativo e muito prazeroso é difícil pra caramba.
De novo, a boa notícia
é que não é impossível. Mas precisa de muita coragem, muito enfrentamento,
muita informação, muito apoio das amigas... muita política. É aí que entra o
feminismo: a ideia radical de que as mulheres são gente, de que nosso corpo nos
pertence, essas coisas tão básicas mas tão distantes da nossa vida média.
Eu sou a Anna P., uma
mulher média. O feminismo salvou minha vida. E transformou radicalmente minha sexualidade.
Muito prazer.