segunda-feira, 9 de março de 2015

O que uma mulher leva para a cama?


Sexo ainda é um assunto tabu. Mas não esse sexozinho misógino da indústria pornô clichê. Esse atrapalha bastante a vida sexual de homens e mulheres, principalmente adolescentes, com suas mentiras plastificadas sobre corpo e sexualidade, mas não é tabu. É produto de livre circulação, consumido em larga escala. Quando muito, pode ser tabu para algumas religiões.

Agora, se você quiser testar no mundo uma coisa muito mais ofensiva do que sexo e muito mais herética que o ateísmo, experimente abrir sua pequena boca para falar sobre liberdade sexual feminina. Chuva de pedras, Madalena!

Pois é, o tabu é a sexualidade feminina. Mulher gostando, sabe? Por incrível que pareça. Ou não tão incrível, pra quem tem consciência da violência que sofre. E se nenhuma pessoa vai pra cama sozinha, imagine o que  leva pra cama uma mulher!

Uma mulher média sofre uma pesada repressão física e sexual desde bem pequena. Quando nasce, tem suas orelhas furadas e carrega incômodos lacinhos na cabeça, usa vestidos desconfortáveis que logo vão lhe impedir de agachar ou sentar com as pernas abertas porque “você já é uma mocinha, não pode ficar mostrando a calcinha por aí”. Depois ela vai aprender que os meninos têm pinto ou pipi, dos quais se orgulham muito e que são nomes tranquilos de dizer, enquanto ela... “Menina, tira a mão daí!”. Xoxota, xaninha, periquita, pepeca... alguém conhece um único nome pra buceta que não venha carregado de constrangimento?

Uma mulher média na adolescência já aprendeu a não se masturbar, a ter vergonha dos seios, a nunca ficar à vontade corporalmente, a temer os homens − que são seres superiores, ainda que sejam menos capazes de se controlar sexualmente do que gorilas. Aprendeu que seu único atributo de real valor é a beleza e, portanto, que é feia demais, ou gorda demais, ou velha demais etc. Que homens e mulheres não são iguais: homens são demais e mulheres são de menos.

Todos os dias, uma mulher média sente medo de ser atacada pelo homem médio. A mulher média já sentiu mais de uma vez um grande pavor com assédio de rua, ameaças de parceiros, violência doméstica, no trabalho etc. Uma mulher média já foi assediada e/ou molestada e/ou violentada. E aprendeu que a culpa é dela.

É isso que uma mulher média leva pra cama. E é obviamente por isso que sexo consensual, leve, relaxado, criativo e muito prazeroso é difícil pra caramba.

De novo, a boa notícia é que não é impossível. Mas precisa de muita coragem, muito enfrentamento, muita informação, muito apoio das amigas... muita política. É aí que entra o feminismo: a ideia radical de que as mulheres são gente, de que nosso corpo nos pertence, essas coisas tão básicas mas tão distantes da nossa vida média.

Eu sou a Anna P., uma mulher média. O feminismo salvou minha vida. E transformou radicalmente minha sexualidade. 

Muito prazer.