Ninguém nasce mulherão, torna-se
Há alguns anos, um amigo disse que eu era um mulherão difícil de
encarar. Fiquei perplexa. Foi a primeira de muitas dispensadas desse gênero que
eu iria colecionar a partir dali.
Hoje esse comportamento já não me surpreende: acho graça, tenho
preguiça, de vez em quando fico triste. Mas que raios significa esse tal de
“mulherão”?
Em primeiro lugar, estou longe de ser uma mulherona. Não sou grande, nem
gorda, nem voluptuosa. Em sentido literal, não tenho nada de mais e poderia
perfeitamente passar despercebida. Minha beleza se realiza muito mais nos
traços do meu caráter do que no aspecto físico (outro dia falo mais sobre
isso). Ainda assim, é fato que sou considerada uma mulher muito atraente. Isso
torna alguns homens mais tímidos, mas não chega a coibir demonstrações de
interesse. Tem quem se jogue, tem quem fique rodeando, mas quem quer se
aproximar se aproxima.
Se a coisa não é física, talvez seja intelectual. No entanto, ainda que
sejamos mais difíceis de afrontar, não me parece que mulheres inteligentes
correspondam a “mulherão” no imaginário do homem médio. Ao contrário, as
inteligentes somos nerds, chatas, barangas, histéricas... mas nada
a temer. E o mulherão é algo temível.
Um enigma. Fisicamente estou mais para mulherinha e intelectualmente me
alinho às feministas “mal-comidas”. No entanto, sempre aparece esse
atemorizante, ameaçador, substantivo e masculino mulherão a espantar da minha
cama aquele amigo e tantos outros. Acho que é esse o ponto: o que me torna
atraente é também o que assusta.
Não sou nem de longe um “mulher fálica”, não estou em disputa de poder
com ninguém, mas sou uma mulher visivelmente empoderada. E isso significa
bastante coisa: significa que estou confortável no meu corpo, não importa a
forma que ele assuma, e que há tempos fiz as pazes com a minha sexualidade.
Significa que gosto de sexo e não vejo problema em gostar, que sei muito bem do
que meu corpo é capaz e também sei que meu prazer depende essencialmente de
mim. Querendo ou não, isso transparece (ou “exala”, como muitos dizem), é o tal
do sex appeal. De fato, sou bastante segura e disponível para sexo
e amizade. Sexo consensual, com respeito, sem intriga e sem posse. Com amor ou
sem amor – mas com humor.
Tomei posse do meu corpo, estou à vontade nele, uso pra me divertir e o
resto não era pra ser problema meu. Só que é. Porque a maior parte dos homens
corre dessa mulher que eles tanto dizem desejar. Porque o machismo afeta todo
mundo, castra mulheres e homens e porque, no caso deles, deve ser muito
desgastante viver com a própria masculinidade sempre sob ameaça.
Não foi fácil. Ainda não é. Mas é bem gostoso.